Aqui vão as respostas que recebi das questões que surgiram como eu pedi aos meus leitores, dentro do pedido e do experimento que formarão esta nova série no Substack.
Respondi de um jato só, para manter a sinceridade e a autenticidade, e na ordem que me foram enviadas na caixa de e-mail.
Quem quiser fazer mais perguntas para a próxima edição, é só fazê-las retornando esta mensagem.
Apenas um leitor pediu que seu nome não fosse revelado; como os outros não reclamaram de nada, mantive a autoria de cada questão. Nas edições seguintes, quem quiser seu anonimato, é só me avisar, por favor.
Aguardo as novas questões.
Até a próxima!
MVC
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Estou começando na vida acadêmica, na área de Artes Visuais, e gostaria de dicas sobre como escolher autores que prestem.
Pergunto pois me considero conservadora, mas sei que questões intelectuais vão além de divisões superficiais e que não dá pra confiar só porque alguém se autodenomina conservador até porque meu interesse é em uma formação sólida, venha de onde vier. Mas não sei por onde começar (rsrs).
Ah, e se você puder dar dicas também sobre como começar a estudar filosofia, agradeceria imensamente. – L.V.
A primeira coisa que você precisa fazer não é ir atrás dos críticos de arte e sim ver os quadros dos pintores, ouvir as grandes peças de músicas dos compositores, assistir a inúmeros filmes e ler, ler muito, os clássicos e os melhores livros dos escritores contemporâneos.
Depois você vai atrás dos críticos e dos analistas que resolveram dissecar essas obras.
Dito tudo isso, acho que você pode ter uma boa noção das Artes Visuais se ler os livros do Robert Hughes, E. B. Gombrich, Carlo Giulio Argan e, mais recentemente, Hilton Kramer e Makoto Fujimura (leia com atenção “Arte e Fé”, disponível no Brasil). E, claro, tenha sempre em mãos um exemplar das Cartas de Van Gogh, quase um livro de sabedoria sobre como o artista precisa viver (e sobreviver) nesses tempos malucos.
Sobre os pintores, sugiro estudar atentamente Piero Della Francesca, Bosch, Goya, Caravaggio, Bonnard e Gerhard Ritcher. Ou seja: entender de fato como eles provocaram todos aqueles efeitos na sua sensibilidade.
E talvez para se sentir inspirada quando tudo for desabar (porque vai), leia “A hora dos assassinos”, do Henry Miller (você vai entender o motivo e tem tudo a ver com a dica que me pediu de Filosofia).
Tendo em vista a busca que o indivíduo faz durante todo o percurso de sua vida pela procura da liberdade interior e espiritual, quais são os instrumentos que ele possui para resistir às implicações do "Mal" em sua alma? Onde nasce e como se origina a capacidade de resistir do indivíduo? – Paulo Henrique Santos
O único instrumento que o indivíduo possui para resistir ao Mal é se abrir voluntariamente ao mistério da Graça. O ser humano, por si mesmo, não tem forças para combater algo que, no fundo, é também intrínseco à sua própria natureza.
O relacionamento do homem com Deus é silêncio? – Gabriel de Faria
Se você entender o silêncio de Deus como a maneira em que o mundo objetivo se revela diante dos seus cinco sentidos, sim. Você apenas precisa prestar muita atenção para perceber esses sinais. Se não fizer isso, realmente não escutará mais nada.
Em sua opinião, quais as lições de Robert Bresson para os cineastas de hoje? – Jeová Lemos Medim
A lição de Bresson para os cineastas de hoje é a mesma que São Bento deu aos seus companheiros de mosteiro: ora et labora, ora et labora, ora et labora.
Martim, dentre os vários cantores e cantoras, bandas e grupos musicais que você já comentou ou se referiu, sinto falta de alguma menção, boa ou ruim, sobre os australianos do AC/DC. Pela relevância que eles possuem (ou não) no rock, gostaria de umas palavrinhas, mesmo que poucas, sobre a banda. – Leandro Rizzi
AC/DC é um grande grupo de rock, gosto de ouvi-los, mas sejamos sinceros: é música para gente que sofre de síndrome de Peter Pen – e não chega perto de ser comparado com, por exemplo, The Velvet Underground ou a carreira solo de Lou Reed.
Como combater a cultura woke sem ser taxado de reacionário ou qualquer do tipo? – Guilherme Santos
Em primeiro lugar, você precisa entender que a cultura woke já é algo reacionário em si mesma.
Em segundo lugar, estude e leia muito, de preferência os grandes autores, e elabore, junto com eles, um código seu para que você converse com essa “república invisível”.
Em terceiro lugar, tenha mulher, filhos e faça de tudo para manter a sua cidadela particular.
E, em quarto lugar, mas não menos importante, entenda que, para salvar a cultura, é fundamental não ficar obcecado com política.
A primeira pergunta que veio à mente é boba mas sou curioso. Como seria uma revista dos sonhos que você gostaria de escrever? Uma possível e uma impossível (com colegas escritores que já morreram por exemplo) e o que uma revista precisa ter para ser boa e útil para a cultura brasileira? – Paulo Jorge Florindo Barcia
Em todos os casos, eu precisaria ser o editor-chefe, com carta branca.
Como isso nunca acontecerá, informo-lhe que eu já fiz uma revista dos sonhos possível. Foi a Dicta&Contradicta, que criei junto com um grupo de amigos. Sem ela, não existiria a Nova Direita (sim, eu sou culpado deste crime). Mas era muito cacique para pouco cocar, e a revista desandou por cismas internos.
Já a impossível seria reunir, numa mesma edição, desde gente como Ivan Lessa, Paulo Francis e Millor Fernandes, até gênios como Edmund Wilson e William Maxwell, passando por uma turma muito talentosa que surgiu agora há pouco, como o Luis Villaverde, o irmão dele, João, o meu amigo Dionisius Amêndola, o Maurício Righi, entre outros.
É possível ser Carl Schimitt, Lex Luthor e Lourival Fontes reencarnado em uma pessoa?
Cristina, Rosangela, Silla e Rosario são exorcistas da maré vermelha que afunda o lado sul de nuestra America? – Sergio Barbi
Tudo é possível nessas veias abertas da América Latina, Sergio.
Martim, eu fico fascinado com a maneira como você pensa e estrutura seu pensamento, principalmente quando fala de espiritualidade e a alma na literatura e cultura. Sinto isso desde que li “A Poeira da Glória”, e com seus textos no Substack o sentimento aumentou.
Minha pergunta, nem eu mesmo sei se estou formulando direito, é como você descobriu que se importa com esses temas? Em que momento isso passou a ser tão importante na sua vida? – Guilherme Matos
Descobri tudo isso no dia 11 de setembro de 2001, quando vi os ataques contra o World Trade Center. Conto um pouco disso na introdução do meu primeiro livro, Crise e Utopia – O Dilema de Thomas More (2012). E os anos seguintes só comprovaram aquilo que eu chamei de “a permanência da perda” – e os fatos que vivi depois confirmaram esse insight sobre a realidade.
Martim, você é católico? – Gabriel de Freitas Teixeira
Parafraseando Eric Voegelin quando perguntaram se ele era cristão: “Tento ser”.
Caro Martim,
Seus textos sempre me fazem refletir. No momento, a bola da vez é a Justiça. Se por um lado temos o Devil´s Speech do Paul Scofield, por outro, a realidade nos mostra que se seguirmos todos as regras, ninguém vai realmente pra cadeia.
Penso se o Sergio Moro enfrentou esse dilema. No entanto, o alerta de Orson Welles em “Touch of Evil” é patente. Como resolver esse paradoxo? Como não errar quando o momento de tomar uma decisão chegar? Como ver a realidade se precisamos de distância e do tempo? – Diego Regazi
Se nem Aristóteles resolveu toda essa lista de problemas, você acha que conseguirei fazer o mesmo?
Se há uma resposta, acho que pode ser esta: não tem como saber exceto se você aceitar que vai errar o tempo todo; e quando isso acontecer, admitir o fato, pedir perdão, sacodir a poeira e ir em frente.
O importante é não parar. Como diria o grande filósofo belga Jean Claude Van Damme: “Retroceder nunca, render-se jamais”.